Sou...

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Zürich, Zürich, Switzerland
Irrequieta. Curiosa. Criativa. Apaixonada. Versátil. Nasci quando as estrelas se juntaram para me ditarem no destino a Arte. Deveria estar frio... mas eu não me lembro. Escrevo desde que aprendi a fazê-lo. Umas vezes para me divertir, outras por desafio a mim mesma, outras porque as mãos me suam, implorando que o faça. Talvez um dia dê ouvidos aos meus amigos e faça por escrever um livro e o publique. Os textos e fotografias deste blog são da minha autoria, salvo aqueles que estão assinalados em contrário.

Doces de Amêndoa e Manjericos



Ainda no crepúsculo de um dia que vai começar, debaixo do edredão de penas, procuro-te com as mãos. Não o teu corpo, o teu sexo... Procuro o teu palpitar, as batidas do teu coração, a tua vida cheia de momentos por viver. Procuro o teu acordar lento e meigo, o abraço que me entregas, com um sorriso.

É hora, vamos - digo-te. E dou-te a mão, para te arrastar para fora da cama. Sais de gatas, como um bebé, ou como um tigre ensonado que desperta depois de uma refeição farta. Bocejas, espreguiças-te e puxas-me para ti para me beijares os olhos e dizeres bom dia.

Vou ligar a máquina de café enquanto tu tiras do armário uma manta quente. Vamos lá para fora, para a varanda virada para este, para ver o sol nascer. O cheiro do café forte desperta-nos os sentidos, e o quente do líquido amargo e acidulado desperta os corpos. Está fresco. Os amanheceres de Verão são sempre frescos, dizes-me. E encostas o teu peito nu nas minhas costas, depois enrolas-nos na manta azul mar e esperamos.

O céu muda de cor, o sol espalha-se pelo planalto, sobe os pequenos montes, toca o rio, e continua a cobrir tudo de luz, parecendo correr apressado pela Terra, enquanto se levanta.

Da sala vinha o som da mais recente selecção de músicas que tínhamos feito, num desses serões entre amigos, em que se joga trivial e se bebe Vinho do Porto em pequenos goles. Cada um procurava uma música. E todas elas seriam compiladas num CD, que ao fim da noite guardaríamos como recordação. A regra: só podia ser música portuguesa. E agora, Zeca Afonso, com a sua Canção de Embalar, logo pela manhã, dava uma magia diferente ao dia que começava.

Nero junta-se a nós, pedindo para sair. Hoje ele vai ter que esperar.

Levanto-me e segues-me até ao duche. Ficas a ver-me através do vidro que vai embaciando. Sorrio quando o teu desejo se torna visível. E depois sorrio por me deixares no meu momento, sem me provocares, sabendo que não consigo resistir. Dás-me a toalha branca, que cheira a fresco. Seco-me com ela, deixando-te depois sozinho.

No dia anterior tínhamos recebido uma encomenda com pequenos mimos e iguarias de presente. O habitual pequeno almoço com ovos, manga e pão fresco, hoje era substituído por pão torrado com manteiga, marmelada, queijo da Serra, uma colecção de miniaturas de doces confeccionados com amêndoa , cerejas do Fundão , sumo de maracujá e água. A mesa está posta, quando sais despenteado, descalço e com a barba por desfazer da casa de banho. Adoro ver-te assim, pela manhã, Cabeça de Andorinha. Passou pouco mais de hora e meia desde que acordámos e vamos no segundo café. Viciados!!!

Saímos para a rua, com as chaves do barco no bolso e o cesto do piquenique. Nero à nossa frente abana a cauda de contente. Pelo caminho reparamos como a chuva dos dias anteriores fez bem à terra e o verde ficou com mais brilho. Nero dá pequenas corridas nas quais se afasta, para voltar para a nossa beira. Depois atiras-lhe com o pau que ele te trouxe. Ele corre para o apanhar e regressa com ele na boca, para repetir a brincadeira. Deixa-mo-lo em casa de Natália, que nos cumprimenta com um abraço e se despede piscando o olho ao desejar-nos um dia feliz.

Chegamos ao cais e entramos. Subimos o rio e baixamos ferro num local onde ele corre lento e pouco profundo. É ali que às vezes escrevemos as nossas histórias a duas mãos, que nos libertamos para fotografias atrevidas, que fazemos amor, que deitas a cabeça na minha barriga e ficas a ler em voz alta um dos teus livros, enquanto dedilho e formo pequenos caracóis no teu cabelo.

O dia está quente. Quente e invulgarmente húmido para esta hora do dia. Mergulhamos para nos refrescarmos.


Decidimos testar a resistência ao desejo. É um jogo que nos dá prazer, a espera para nos sentirmos...

Um Quinta da Lixa muito fresco acompanha-nos a conversa sobre as aventuras e desventuras nos projectos que tomaram pernas e seguem em frente, sobre amigos que ligaram com um convite para uma festa, sobre a próxima viagem a Nova York, sobre as obras que precisam ser feitas em casa, sobre o teu sonho de ser um escritor reconhecido, sobre o meu sonho de abrir uma biblioteca onde anciãos contam histórias de lobisomens e bruxas. Os cigarros acumulam-se em beatas no cinzeiro.

A fome assoma e deliciamos-nos com comida prática, simples mas deliciosa. Pão de cacete com fiambre, queijo, paio, ovo, maionese, tomate e alface, pão de cereais barrado com queijo fresco e recheado com tomate e ainda tostas pequeninas que cobrimos umas vezes com creme de abacate onde o paladar descobre cebola, salsa, vinagre, pimenta e ovos, outras com creme de atum, com notas de mostarda, pickles e salsichas.

A tarde desenrola-se vagarosa e tu lês “As pontes de Madison County”, de Robert James Waller para mim. ( download do livro aqui )

“Já cheira bem," disse Robert apontando para o fogão. "É um cheiro tranquilo." Olhou para ela. "Tranquilo? Haverá algo que tenha um cheiro tranquilo?" Ela estava pensando na frase, interrogando-se a si mesma. Ele tinha razão. Depois das costeletas de porco e,dos assados que cozinhava para a sua família, aquilo era um cozinhado tranquilo. Não havia violência em nenhum ponto da cadeia alimentar, exceto, talvez, no fato de os vegetais serem arrancados. O guisado fervilhava lentamente e cheirava a tranquilidade. A atmosfera na cozinha era tranquila. “

(...)

“Sem darem por isso, tinham avançado lentamente pela pradaria e andado um bom pedaço; depois voltaram pelo mesmo caminho de volta para casa. A escuridão abateu-se sobre eles enquanto atravessavam a cerca, que desta vez ele segurou para que ela passasse. Francesca lembrou-se do conhaque. "Tenho ali conhaque. Ou prefere café?" "Há alguma possibilidade de serem ambas as coisas?" As palavras dele provinham da escuridão. Ela sabia que ele estava sorrindo. Quando chegaram ao círculo de luz que o candeeiro do pátio projetava na grama e no cascalho, ela respondeu: "Claro", percebendo na sua própria voz um tom que a perturbou. O som das gargalhadas espontâneas nos cafés de Nápoles. Não foi fácil encontrar duas xícaras que não estivessem lascadas. Embora ela soubesse que xícaras lascadas faziam parte da vida de Robert, desta vez queria xícaras perfeitas. Haviam dois cálices de conhaque, virados para baixo, na parte de trás do armário; nunca tinham sido usados, como o próprio conhaque. Francesca teve de se pôr na ponta dos pés para lhes chegar e percebeu que tinha as sandálias molhadas e os jeans muito apertados atrás. Ele estava sentado na mesma cadeira de antes, a observá-la.”

Agora desejo-te e sinto que não consigo conter-me muito mais. Massajo-te as costas, o pescoço, a nuca, os braços, o peito... e depois busco o teu beijo. Uma chuva torrencial desaba sobre nós quando começamos a fazer amor. Rimos, divertidos, com o prazer aumentado pela água fria que nos molha o corpo e nos arrepia a pele. A trovoada lá longe não chegou aqui, mas trouxe a bênção a uma região alargada. Ficamos abraçados e acabamos por adormecer, já abrigados da chuva e secos.


A noite aproxima-se quando me acordas , desenhando letras no meu peito e braços.


Regressamos a casa para trocar de roupa e irmos até à cidade. Chega-nos de lá o cheiro da foz, a sardinha assada, alho, manjericos e festa. Vamos parando em tasquinhas improvisadas, comemos, bebemos, cumprimentamos amigos, conhecidos e muitos outros que se cruzam connosco.

Lançamos os nossos balões no ar, dançamos, cantamos. O fogo de artifício explode e enche de luz e cor o céu nocturno, perfumado. É boa esta coisa que se sente no ar... e ficamos por cá. Não resistimos a trazer manjerico e algumas loiças de barro para o jardim.

Em casa, espera-nos Everyone says I Love You, com Woody Allen, Drew Barrymore e Natalie Portman, entre outros, no Dvd. Seguimos o cheiro do pão acabado de cozer, entramos na padaria e estamos outra vez entre amigos. Bom dia, trocamos, quando já todos pedem o conforto de um pão quente e uma cama feita de fresco.


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