Sou...

A minha foto
Zürich, Zürich, Switzerland
Irrequieta. Curiosa. Criativa. Apaixonada. Versátil. Nasci quando as estrelas se juntaram para me ditarem no destino a Arte. Deveria estar frio... mas eu não me lembro. Escrevo desde que aprendi a fazê-lo. Umas vezes para me divertir, outras por desafio a mim mesma, outras porque as mãos me suam, implorando que o faça. Talvez um dia dê ouvidos aos meus amigos e faça por escrever um livro e o publique. Os textos e fotografias deste blog são da minha autoria, salvo aqueles que estão assinalados em contrário.

Insónia


Deitado a menos de 20 cm, o corpo dele. O espírito, esse abandonou-o, quando ao fechar os olhos se deixou ir num sono que chegou lento mas desejado.


Alguns minutos antes, eu ainda lhe dava as costas, fingindo ter-me deixado vencer pelo cansaço de um dia longo e quente, dizendo-lhe para não me tocar. Depois de lhe sentir a respiração regularizada e tranquila, embalada e ritmada, voltei-me para o olhar à luz do luar que entra pela janela que raramente tem a persiana descida. Olho para ele, fecho os olhos, faço força, volto a abri-los. Repito. Mas não acontece nada. Quando os abro, ainda não me apaixonei... ainda não o desejo, ainda não consigo sequer sentir compaixão, ternura ou pena por saber que nunca vou sentir o mesmo que ele diz sentir por quem gostava que eu fosse.

Ele dorme e a minha insónia pede-me que dê de beber à sede que me seca a garganta. Deixo a água correr livre da torneira do lava-loiça até se sumir pelo ralo e quando vem fresca encho o copo e bebo. Encostada na porta do frigorífico, fixo o branco da parede, tentando pensar. Não importa o pensamento que venha. Queria apenas um pensamento que fosse, sair desta apatia que me faz sentir robótica e telecomandada ao sabor de ordens e tarefas a desempenhar. Mais uma vez nada acontece e desisto, baixando os olhos. No telemóvel uma luz pisca, anuncia uma mensagem ou chamada perdida. É fim de semana, não quero saber. Por mim pode esgotar-se de bateria que não lhe pego até segunda. Antes de apagar a luz, pego no maço de L&M light e depois vou para a varanda. Aqui os sons e cheiros são diferentes dos da cidade. Cheira-se a terra seca, as vacas que pastam durante o dia a mais ou menos 2 km dali, cheira a erva cortada e calor que se despende dos prados que estão sempre verdes. E ouvem-se grilos, cigarras, mochos e guinchos de morcegos que caçam insectos. E de longe a longe, avistam-se pirilampos. A juntar a isto, o fumo do meu cigarro que sobe e se misturam no ar e o arder lento do tabaco que produz sons quase inaudíveis no lento definhar que o consome.

A lua está alta e o céu claro. E eu pergunto-me se tu olhasses as estrelas numa noite escura, conseguirias indicar o nome de meia dúzia de estrelas e duas ou três constelações. Bastar-me-ia apenas que soubesses reconhecer a Ursa Menor, Spica, Marte, Andrómeda e Orion...

Dou mais uma passa no cigarro, inspiro lentamente... e suspiro. Talvez isto seja saudade! Saudade de um tempo que não existe... ou saudade das fadas pequeninas que transportam as estrelas que caiem e nos dão desejos. E esta noite, se houvesse uma estrela a cair do céu... eu pediria uma chuva divina e um diabo com asas que me abraçasse até a noite passar.

Trieste



-“Grazie Paolo!” E com um braço no ar acenas “arrivederci”.

Os miúdos apercebem-se da chegada do táxi e correm para a porta saltando-te para os braços e pernas mal entras em casa. Por entre os braços pequeninos que te envolvem o peito, as costas e a cabeça, e os beijos, dás-me um sorriso. Eu retribuo e aceno positivamente e nesse momento és arrastado para o quarto deles para te sentares na poltrona e contares a história de mais uma viagem. Os olhos grandes fixam-se no teu rosto, e tu começas a falar das cores com que o Outono pintou os parques de Antwerp e dos reflexos da cidade no cais...

“Estavam cansados, passámos o dia a brincar na areia e na água”, digo-te, quando passados 10 minutos adormecem os dois no teu colo. Ajudo-te a deitá-los e depois ficamos abraçados, a matar saudade do toque e do calor... a tentar num momento recuperar o tempo e a distância que nos separou nos últimos dias.

Estamos no final de Setembro e as noites arrefecem. Mas vamos sentar-nos nas escadas que dão para a praia. O mar está calmo e embala-nos num conforto que se compõe com um chá de flores de hibisco quente. Trocamos as últimas novidades de uma forma leve e rápida. Temos pressa para nós. E depois acontece o beijo que principia num abraço e não se quer soltar. Sinto as tuas mãos no meu corpo e as minhas procuram-te. É um toque leve, mas que vibra e me percorre mesmo nos pedaços de pele onde não tocas. Pego-te na mão e coloco-a sobre o meu ventre e olho para ti. Sorris...

-“Quando soubeste?”


-“Hoje...”


E voltas a abraçar-me, aquecendo-me as costas que arrefeceram.

Entramos e conduzes-me até ao quarto. Esta noite é para saciar o desejo e o que arde em nós...